Exposição com pedido de esclarecimento.
Senhor Primeiro Ministro:
Sou
Coronel reformado do Exército Português com o BI Militar nº 51193111 e, porque
deixei de acreditar na Justiça do meu País, com pena minha, recorro ao senhor
na expectativa de que possa vir de si alguma explicação para o que de seguida
passo a expor:
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1º
- Ao longo de 60 anos de vida fui (e vou) depositando num Banco uma
parte do magro vencimento (de há vinte para cá transformado em pensão)
que ia
auferindo depois de ter com ele estabelecido o contrato respectivo por
ele e
por mim aceite. Acontece que esse Banco decidiu este ano rescindir
unilateralmente esse contracto resolvendo, em acto considerado por um
anterior
governante respeitável como "um assalto à mão armada", ROUBAR-ME uma
parte substancial da verba que se comprometera
a entregar-me, sem que eu me pudesse defender de tão vil
gesto.
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2º
- Já o ano passado eu fora espoliado pelo mesmo Banco em duas verbas
importantes do seu compromisso para comigo, apesar de a Lei em vigor o
não permitir e a justiça o ter condenado mas tendo acabado por sancionar
a ilegalidade atendendo a que iria baralhar as contas do Banco porque
já era tarde etc, etc. Daí, como lhe disse, o meu descrédito em relação a
essa "senhora".
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3º
- Naturalmente o senhor já sabe que esse Banco se chama Estado. E,
claro, escuso dizer-lhe quem é o gerente principal do mesmo a quem devo a
decisão atrás referida.
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4º
- Há ainda, incluída na importância de que que fui velhacamente
"aliviado",
uma parte chamada de, salvo erro, "Comparticipação de Solidariedade"
cujo nome me deixa deveras enfurecido. É que para ser solidário devia
competir-me a mim a decisão sobre quem seria o beneficiário de tal gesto
uma vez que se trata de DINHEIRO MEU. Mas
fiquei a saber que, por mão alheia, esse dinheiro se destina a cobrir a
roubalheira perpetrada por responsáveis doutros Bancos, o que me transforma num
agente solidário com vigaristas e vigarices, facto que a minha dignidade (eu
sei que a palavra está em desuso para não dizer em queda livre no vocabulário
da Língua Portuguesa, mesmo com o miserável Acordo Ortográfico que nos foi
imposto) a minha dignidade, repito, Pessoal
e
de Militar recusa veementemente admitir. (Já agora, e a-propósito do
dito
Acordo, esclareço-o de que o plural de acordo é acôrdos e não acórdos
como o senhor e outros cavalheiros do seu governo de forma irritante
pronunciam. Os acentos foram colocados apenas para
salientar as pronúncias).
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5º
- Só um último pormenor que, pelo facto de o ser, não é de somenos importância.
Pelo contrário. É que quase sinto vontade de lhe chamar um nome feio quando o
ouço falar-me em SACRIFÍCIOS. Por acaso sabe o senhor o que são sacrifícios? Onde, quando e em que circunstâncias os fez?
A
tirar o seu curso, talvez, já que só o completou aos 37 anos, pelo menos assim
é voz corrente. Mas os de outro tipo, os tais que fazem doer o corpo e a alma, e não só do próprio como também da família, e que
deixam marcas indeléveis para toda uma vida, acaso os conheceu alguma vez? Diga-me
onde
porque não acredito que tenham sido no ambiente dos "jotas" onde bem
cedo se encostou para começar a sua carreira política. Lembro-lhe que
está a ler (se é que alguma vez lhe mostrarão)
um escrito de alguém que cumpriu, com orgulho, quatro comissões de
serviço no
Ultramar Português e a quem a tal dita justiça conseguiu roubar uma.
Portanto
cala-se, por favor, e não fale mais em sacrifícios. A ninguém, porque
disso
também o senhor não percebe nada.
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Embora
esteja convicto de que este facto não o incomoda absolutamente nada, informo-o
de que estou a dar conhecimento do que aqui lhe relato a alguns dos meus Amigos
mais chegados. Aceite, apesar de tudo, os meus cumprimentos de homem também educado.
José Caniné