Um corajoso artigo de Bagão
Felix. Subscrevo inteiramente. O homem, se estivesse em Belém faria, sem a
menor réstea de dúvida um serviço muito melhor ao país do que a patética
criatura que diz que foi a influência da nossa senhora de Fátima que levou os
cabrões da Troika a terminar a 7 Esbulhação, ou seja, a 7ª Avaliação.
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E ainda há uns sabujos, uns jovens
que nem currículo têm, a escreverem umas imbecilidades na imprensa de ontem e
hoje a atacar o homem, Os mesmos que apoiam este governo insen´sivel em matéria
social. Fonte: um leitor deste blogue)
para o triunfo do mal, é que os homens de bem nada façam"
(Edmund Burke)
BAGÃO FÉLIX
Pelas razões da sua inegável
oportunidade e importante valia da forma e do conteúdo, com a devida vénia,
transcrevemos do “Público, o excelente artigo do Dr. António Bagão Félix, a que
tivemos acesso através da recepção de correio electrónico.
A GROSSEIRA INCONSTITUCIONALIDADE
DA TRIBUTAÇÃO SOBRE PENSÕES
Aprovado o OE 2013,
Portugal arrisca-se a entrar no "Guinness Fiscal" por força de um
muito provavelmente caso único no planeta: a partir de um certo valor (1350 euros mensais), os
pensionistas vão passar a pagar mais impostos do que outro qualquer tipo de
rendimento, incluindo o de um salário de igual montante! Um atropelo fiscal
inconstitucional, pois que o imposto pessoal é progressivo em função dos
rendimentos do agregado familiar [art.º 104.º da CRP], mas não em função da
situação activa ou inactiva do sujeito passivo e uma grosseira violação do
princípio da igualdade [art.º 13.º da CRP].
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Por
exemplo, um reformado com uma pensão mensal de 2200 euros pagará mais 1045 € de impostos do que
se estivesse a trabalhar com igual salário (já agora, em termos comparativos
com 2009, este pensionista viu aumentado em 90% o montante dos seus impostos e
taxas!).
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Tudo isto por causa de uma falaciosamente denominada
"contribuição extraordinária de solidariedade" (CES), que começa em
3,5% e pode chegar aos 50%. Um tributo que incidirá exclusivamente sobre as
pensões. Da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações. Públicas e
privadas. Obrigatórias ou resultantes de poupanças voluntárias. De base
contributiva ou não, tratando-se por igual as que resultam de muitos e longos
descontos e as que, sem esse esforço contributivo, advêm de bónus ou
remunerações indirectas e diferidas.
Nas
pensões, o Governo resolveu que tudo o que mexe leva! Indiscriminadamente.
Mesmo - como é o caso - que não esteja previsto no memorando da troika.
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Esta obsessão pelos reformados assume, nalguns casos,
situações grotescas, para não lhes chamar outra coisa. Por exemplo, há poucos
anos, a Segurança Social disponibilizou a oferta dos chamados
"certificados de reforma" que dão origem a pensões complementares
públicas para quem livremente tenha optado por descontar mais 2% ou 4% do seu
salário. Com a CES, o Governo decide fazer incidir mais impostos sobre esta
poupança do que sobre outra qualquer opção de aforro que as pessoas pudessem
fazer com o mesmo valor...
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Ou seja, o Estado incentiva a procura de um regime
público de capitalização (sublinho, público) e logo a seguir dá-lhe o golpe
mortal. Noutros casos, trata-se - não há outra maneira de o dizer - de um
desvio de fundos através de uma lei: refiro-me às prestações que resultam de
planos de pensões contributivos em que já estão actuarialmente assegurados os
activos que caucionam as responsabilidades com os beneficiários.
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Neste caso, o que se está a tributar é um valor que já
pertence ao beneficiário, embora este o esteja a receber diferidamente ao longo
da sua vida restante. Ora, o que vai acontecer é o desplante legal de parte
desses valores serem transferidos (desviados), através da dita CES, para a
Caixa Geral de Aposentações ou para o Instituto de Gestão Financeira da S.
Social!
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O curioso é que, nos planos de pensões com a opção pelo
pagamento da totalidade do montante capitalizado em vez de uma renda ou pensão
ao longo do tempo, quem resolveu confiar recebendo prudente e mensalmente o
valor a que tem direito verá a sua escolha ser penalizada. Um castigo acrescido para quem poupa.
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Haverá
casos em que a soma de todos os tributos numa cascata sem decoro (IRS com novos
escalões, sobretaxa de 3,5%, taxa adicional de solidariedade de 2,5% em IRS,
contribuição extraordinária de solidariedade (CES), suspensão de 9/10 de um dos
subsídios que começa gradualmente por ser aplicado a partir de 600 euros de
pensão mensal!) poderá representar uma taxa marginal de impostos de cerca de
80%!
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Um cataclismo tributário que só atinge reformados e não
rendimentos de trabalho, de capital ou de outra qualquer natureza! Sendo
confiscatório, é também claramente inconstitucional. Aliás, a própria CES não é
uma contribuição. É pura e simplesmente um imposto. Chamar-lhe contribuição é
um ardil mentiroso. Uma contribuição ou taxa pressupõe uma contrapartida, tem
uma natureza sinalagmática ou comutativa. Por isso, está ferida de uma outra
inconstitucionalidade. É que o já citado art.º 104.º da CRP diz que o imposto
sobre o rendimento pessoal é único.
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Estranhamente, os partidos e as forças
sindicais secundarizaram ou omitiram esta situação de flagrante iniquidade. Por
um lado, porque acham que lhes fica mal defender reformados ou pensionistas
desde que as suas pensões (ainda que contributivas) ultrapassem o limiar da
pobreza. Por outro, porque tem a ver com pessoas que já não fazem greves, não
agitam os media, não têm lobbies organizados.
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Pela mesma lógica, quando se fala em redução
da despesa pública há uma concentração da discussão sempre em torno da
sustentabilidade do Estado social (como se tudo o resto fosse
auto-sustentável...). Porque, afinal, os seus beneficiários são os velhos, os
desempregados, os doentes, os pobres, os inválidos, os deficientes... os que
não têm voz nem fazem grandiosas manifestações. E porque aqui não há embaraços
ou condicionantes como há com parcerias público-privadas, escritórios de
advogados, banqueiros, grupos de pressão, estivadores. É fácil ser corajoso com
quem não se pode defender.
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Foi lamentável que os deputados da maioria (na qual
votei) tenham deixado passar normas fiscais deste jaez mais próprias de um
socialismo fiscal absoluto e produto de obsessão fundamentalista,
insensibilidade, descontextualização social e estrita visão de curto prazo do
ministro das Finanças.
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E pena é que também o ministro da Segurança Social não
tenha dito uma palavra sobre tudo isto, permitindo a consagração de uma medida
que prejudica seriamente uma visão estratégica para o futuro da Segurança Social.
Quem vai a partir de agora acreditar na bondade de regimes complementares ou da
introdução do "plafonamento", depois de ter sido ferida de morte a
confiança como sua base indissociável?
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Confiança que agora é violada grosseiramente por ditames
fiscais aos ziguezagues sem consistência, alterando pelo abuso do poder as
regras de jogo e defraudando irreversivelmente expectativas legitimamente
construídas com esforço e renúncia ao consumo.
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Depois
da abortada tentativa de destruir o contributivismo com o aumento da TSU em 7%,
eis nova tentativa de o fazer por via desta nova avalanche fiscal. E logo
agora, num tempo em que o Governo diz querer "refundar" o Estado
Social, certamente pensando (?) numa cultura previdencial de partilha de riscos
que complemente a protecção pública. Não há rumo, tudo é medido pela única bitola de mais e
mais impostos de um Estado insaciável.
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Há
ainda outro efeito colateral que não pode ser ignorado, antes deve ser
prevenido: é que foram oferecidos poderosos argumentos para
"legitimar" a evasão contributiva no financiamento das pensões.
"Afinal, contribuir para quê?", dirão os mais afoitos e atentos. Este
é mais um resultado de uma política de receitas "custe o que custar"
e não de uma política fiscal com pés e cabeça.
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Um abuso de poder sobre pessoas quase tratadas como
párias e que, na sua larga maioria, já não têm qualquer possibilidade de
reverter a situação. Uma vergonha imprópria de um Estado de Direito. Um
grosseiro conjunto de inconstitucionalidades que pode e deve ser endereçado ao
Tribunal Constitucional.
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PS1: Com a antecipação em "cima da hora" da
passagem da idade de aposentação dos 64 para os 65 anos na função pública já em
2013
(até agora prevista para 2014), o Governo evidencia uma enorme falta de
respeito pela vida das pessoas. Basta imaginar alguém que completa 64 anos em
Janeiro do próximo ano e que preparou a sua vida pessoal e familiar para se
aposentar nessa altura. No dia 31 de Dezembro, o Estado, através do OE, vai
dizer-lhe que, afinal, não pode aposentar-se.
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Ou melhor, em alguns casos até poderá fazê-lo, só que
com penalização, que é, de facto, o que cinicamente se pretende com a alteração
da lei. Uma esperteza que fica mal a um Governo que se quer dar ao respeito.
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PS2: Noutro ponto, não posso deixar de relevar uma anedota
fiscal para 2013: uma larga maioria das famílias da classe média tornadas
fiscalmente ricas pelos novos escalões do IRS não poderá deduzir
um cêntimo que seja de despesas com saúde (que não escolhem, evidentemente).
Mas, por estimada consideração fiscal, poderão deduzir uns míseros euros pelo
IVA relativo à saúde dos seus automóveis ,pagos às oficinas e à saúde capilar
nos cabeleireiros.
É comovente...