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22 Mar 2013 03:36 PM PDT
O Chipre foi somente o "start" para
uma subjugação continental financeira...
A exigência da União Europeia de
aplicar no Chipre uma taxa de 6,75% sobre os depósitos bancários entre 20 e 100
mil euros e de 9,9% sobre os depósitos superiores a esse montante provocou o
pânico entre os depositantes e colocou em perigo o sistema financeiro da
ilha.
Alguns peritos vêm nesse fenômeno a crise ideológica do capitalismo
como um sistema baseado nos princípios do mercado livre.
Há bastantes
especialistas a referir que este passo não tem precedentes. Como disse o
político e empresário russo Mikhail Prokhorov, “a UE, na prática, abriu uma
caixa de Pandora ao criar um perigoso precedente na resolução dos problemas de
capitalização do sistema bancário nos países problemáticos. Perigoso antes de
mais por atentar contra o fundamento da civilização ocidental: a inviolabilidade
da propriedade privada.”
O paralelo com a
experiência histórica russa se tornou num lugar-comum: como se sabe, as
autoridades soviéticas realizaram muitas vezes, sob diferentes pretextos,
reformas de confisco monetário. Um imposto único, na forma que é proposta por
Bruxelas, é uma típica expropriação leninista. Também é verdade que existe uma
opinião segundo a qual isto se parece mais com a aplicação do slogan bolchevista
“Rouba o que foi roubado”. Mas mesmo que assim seja, a essência da questão é a
mesma. A “expropriação do que foi expropriado” contradiz os valores fundamentais
do Ocidente da mesma forma que o assalto vulgar (apesar de ser atraente pelo
vislumbre de justiça universal).
Se descermos “das nuvens à terra”, no
caso do Chipre teremos de falar sobre a corrosão dos fundamentos da zona do
euro. Os peritos veem o problema principal no enfraquecimento da confiança dos
depositantes e dos investidores. O mesmo Prokhorov admite que a expropriação
forçada da propriedade privada irá forçosamente provocar uma reação em cadeia:
uma fuga dos depósitos por toda a União Europeia, o fim do sistema bancário, o
colapso financeiro, a paralisia da indústria e o desemprego massivo. Como
resultado, “iremos recordar a crise de 2008 como a idade do ouro do
capitalismo”, conclui Prokhorov.
O eurodeputado português Diogo Feio, do
Partido Popular, recorda os fundamentos sobre os quais assenta a União Europeia:
“os princípios do mercado livre, o respeito pela propriedade privada e a
liberdade de circulação de capitais não podem ser questionados em caso algum”,
considera o eurodeputado. “O desrespeito por esses princípios não corresponde ao
caráter livre e democrático da União Europeia, é antes mais característico dos
regimes comunistas”.
De resto, muitos peritos tendem a não dramatizar
demasiado a situação. Eis o que diz o vice-decano da faculdade de economia e
política mundial da Escola Superior de Economia Andrei Suzdaltsev.
“É
tudo bastante mais complicado. Temos de considerar o que é o Chipre. Se trata de
uma zona offshore dentro do espaço financeiro único da UE e a União Europeia
está interessada em que todas as instituições financeiras funcionem com regras
únicas e com normas comuns. Para que não haja espaços onde se possa “jogar” com
os impostos. Não se pode dizer que isto é o início do desmoronamento do
capitalismo. Por outro lado, não existe um capitalismo puro. Todos os erros dos
governantes foram sempre emendados à custa das pessoas – à custa do seu dinheiro
e da sua qualidade de vida. Não há como fugir a isso. A questão é como isso é
feito. A abordagem é que é surpreendente.”
O primeiro-ministro da Rússia
Dmitri Medvedev declarou na quarta-feira que, na atual situação, a Rússia poderá
colocar a questão da denúncia do acordo para evitar a dupla tributação com o
Chipre. Entretanto, alguns peritos consideram que Nicósia não se irá deixar
impressionar. De acordo com a opinião do diretor do departamento de planejamento
estratégico da empresa FBK Igor Nikolayev, o acordo para evitar a dupla
tributação seria sobretudo importante para os que trabalhavam através do Chipre
sendo ele oficialmente uma zonaoffshore.
Aliás, Nikolayev considera a
analogia com as ações das autoridades soviéticas como pouco adequada. Na sua
opinião, será muito mais correto afirmar que esse tipo de decisões é de admirar
por parte do Eurogrupo, porque a base da economia de mercado é precisamente a
inviolabilidade do direito à propriedade e neste caso ela foi posto em dúvida.
“O próprio Chipre compreende perfeitamente que a medida não é das melhores, o
que ficou demonstrado pela votação no parlamento”, afirma Nikolayev.
O
presidente da União Russa dos Industriais e Empresários (URIE) Alexander Shokhin
recorda, por seu turno, que numa certa altura o Chipre era o único país que,
sendo uma zona offshore, tinha um acordo com a Rússia para evitar a dupla
tributação. Segundo o mesmo afirmou, há uns anos o Ministério das Finanças russo
conseguiu obter um ajuste dessa situação e a tributação começou a aumentar. Daí
o Chipre ter, pouco a pouco, perdido a sua atratividade como paraíso fiscal e
como local onde se podiam esconder os investidores das empresas. “Eu penso que,
de qualquer forma, dentro de cinco a dez anos o Chipre deixaria de ser uma zona
de interesses das empresas e dos particulares”, disse Shokhin. De acordo com o
presidente da URIE, a Rússia já tinha prometido ajuda ao Chipre em troca do
fornecimento de informações acerca dos titulares finais de diversas contas e
esse acordo visava o abandono do estatuto deoffshore. Mas, como é evidente,
ninguém esperava uma jogada tão “forte” como uma expropriação.
Na opinião
dos analistas da RIA Rating, já há muitas décadas que uma decisão tão original
não era aplicada em países desenvolvidos sendo um contrassenso do ponto de vista
histórico. Pode mesmo dizer-se que se atingiu o ponto crítico em que os valores
europeus e os interesses europeus entraram numa contradição evidente e aberta, e
algo terá de ser sacrificado. Dificilmente serão os interesses, os peritos
pensam que serão os valores.
A crise cipriota demonstra que na Europa não
existe nenhum respeito de princípio relativamente à propriedade privada. É
possível que seja realmente cedo para se falar do fim do capitalismo, mas já
está na altura de falarmos sobre uma mudança radical de consequências
imprevisíveis. Os alarmistas admitem mesmo que a União Europeia estará
realizando certas experiências com o Chipre para a espalhar depois pelo resto da
Europa.
Na opinião deles, o Chipre poderá ser o primeiro sinal da futura
expropriação massiva das finanças das empresas e dos cidadãos comuns. O seu
exemplo poderá ser seguido por outros países de baixas taxas fiscais. Antes de
mais, se fala da Suíça, da Holanda e de Malta. Isso poderá ser despoletado, tal
como no caso do Chipre, por uma pressão por parte dos órgãos competentes da
União Europeia.
A culpa disso, dizem os analistas, é do desequilíbrio
evidente dos níveis de impostos, o que resulta numa migração massiva de
capitais. Essa tendência é claramente demonstrada no relatório recentemente
publicado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)
“Sobre a erosão da base tributável e transferência de resultados (para
jurisdições com tributação mais favorável)”. Nele se indicam os países que são
agora uma espécie de “portos seguros” para onde o capital prefere fugir. Foi
determinado, nomeadamente, o coeficiente que indica a relação entre os
resultados das empresas, incluindo as financeiras, e o PIB.
Nos países
desenvolvidos do Ocidente, onde, como se sabe, as taxas de impostos são mais
elevadas, ele varia entre os 0,2 e os 2,6 por cento. Na Holanda ele é de 4,6 por
cento e no Chipre, por exemplo, ele é de 18,2 por cento. Entretanto, num
offshore tão clássico como as Ilhas Virgens Britânicas, esse coeficiente atinge
os 645,7 por cento. Dessa forma, o Chipre está longe de encabeçar a lista negra
da OCDE.
Segundo as evidências, nós podemos perfeitamente estar encarando
um início muito peculiar de uma campanha anti-offshores à escala europeia.
Segundo os peritos, os métodos de regulação podem ser diversos, como por exemplo
a regulamentação dos preços de transferência e a regulação das transações entre
empresas associadas do mesmo grupo. Porém, analisando as primeiras medidas, nos
próximos tempos devemos esperar a introdução de alguns mecanismos de controlo
globais visando impedir as transferências de capitais para os países com taxas
de impostos mais baixas. Tudo indica que, numa altura em que a tributação nos
principais países da União Europeia está em níveis críticos, a seguir aos quais
pode ocorrer uma fuga massiva de capitais, a UE não teve outra saída senão tapar
todas as “fugas” existentes.
Claro que o Chipre era para os europeus um
símbolo do paraíso dos pensionistas – um país de preços baixos com um clima
ameno, onde se vive bastante bem apenas com uma “euroreforma” honesta e
merecida. Uma perda de grande parte das poupanças irá afugentar os potenciais
compradores de imobiliário e fará desmoronar o seu mercado, já de si moribundo.
Mas nem tudo é tão negro. As últimas investigações realizadas pela Comissão
Europeia e pela Agência Internacional de Energia para estudos do futuro mundial
da energia demonstraram que a região do Mediterrâneo Oriental poderá ter jazidas
consideráveis de gás.
Tudo indica que o Chipre deverá iniciar brevemente
a tomada de todas as decisões necessárias para a prospecção das áreas de
hidrocarbonetos, para a construção de terminais de LNG e de terminais de
armazenamento de combustíveis líquidos. A existência de um plano estratégico
geral tem hoje uma importância primordial. Juntamente com os restantes
fornecedores de recursos energéticos do Mediterrâneo Oriental, o Chipre deverá
estudar as possibilidades de cooperação tanto de uns com os outros, como com as
companhias internacionais que se ocupam da prospeção e extração de
hidrocarbonetos na região. Um trabalho em conjunto, a existência de uma
estratégia e objetivos comuns irão, sem dúvida, multiplicar os resultados dos
projetos energéticos. Nesse contexto, a participação da Rússia seria muito
relevante.
Nas próximas décadas, o Chipre tem uma brilhante perspetiva de
se tornar num exportador de recursos energéticos, de se transformar num centro
energético e, possivelmente, numa plataforma que ofereça o pacote completo de
produtos e serviços na área da energia. Se as coisas avançarem, as novas
gerações de cipriotas irão agradecer ao destino por ter feito com que o país
tenha deixado de ser um gigantesco “local de passagem” de capitais à escala
mundial.
Via: http://portuguese.ruvr.ru/2013_03_22/A-mudanca-tera-sua-origem-no-Chipre/
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