terça-feira, 4 de outubro de 2011

Empresas públicas dão mundo de regalias a trabalhadores e familiares


4 de Outubro, 2011por Joana Ferreira da Costa


A Soflusa dá mais de 100 mil viagens grátis por ano. Os filhos dos sete mil trabalhadores da TAP não pagam bilhetes de avião nesta operadora aérea até aos 25 anos e alguns mantêm a regalia mesmo depois de os pais já se terem reformado da companhia. Na Carris, estar de baixa compensa porque a empresa garante ao trabalhador o salário sem descontos.

Numa altura em que um relatório dos Técnicos Oficiais de Contas revela que as empresas públicas ou controladas pelo Estado devem mais de 38 mil milhões de euros, em que as administrações têm de reduzir as despesas em 15%e cortaram 10 % nos salários, a manutenção de algumas destas benesses é considerada ainda «mais escandalosa».

«Há situações que são imorais. E que têm vindo a acumular-se ao longo dos anos», afirma Marques Mendes. Muitos desses privilégios foram herdados do antigo regime, adaptados e renegociados em acordos de empresa com os sindicatos, como forma de compensar os trabalhadores pela ausência de aumentos salariais: «A maior parte das administrações destas empresas foi conivente com a situação. Foram pactuando e acrescentando regalias para comprar a paz social», recorda o ex-líder do PSD.

Nenhuma das empresas públicas ou participadas pelo Estado que o SOL contactou quis adiantar o valor anual gasto com estas regalias sociais. E as várias auditorias do Tribunal de Contas apenas permitem perceber o impacto de algumas delas.

O fim destes direitos adquiridos dos trabalhadores só pode acontecer se houver luz verde do trabalhador e das estruturas sindicais. Mas a situação excepcional do país pode justificar a tomada de decisões extremas. Ainda na semana passada o Tribunal Constitucional invocou isso mesmo para validar os cortes médios de 5% nos salários dos funcionários públicos decididos em 2010.

Marques Mendes defende, por isso, que este é o momento para se alterarem certos benefícios: «A situação é de emergência e as empresas não têm condições para continuarem a manter regalias que não são financeiramente suportáveis. Se se cortam salários, porque não se cortam regalias?».

Para João Duque, presidente do Instituto Superior de Economia e Gestão, é fundamental perceber quanto é que as empresas gastam com estes benefícios. Na instituição que dirige, reconhece, «ainda há ‘o dia do mês’ – que antes do 25 de Abril era dado apenas às mulheres e depois foi alargado aos homens».

O responsável lembra que muitas destas benesses foram usadas como forma de compensar os trabalhadores pela ausência de aumentos salariais. E se a situação do país facilita a tomada de decisões, qualquer mudança não deve ser feita abruptamente e terá de ter em conta critérios de justiça. Até porque «há muitos funcionários públicos a ganhar mal e a trabalhar bem e as instituições não têm forma de os premiar e incentivar», remata João Duque.

joana.f.costa@sol.pt

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