segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Estamos mais pobres? Sim. Recuámos uma década





Não foi só a riqueza anual por habitante a recuar. O consumo também encolheu. Portugal está agora "ao nível de 2002 ou 2003".

inserido em 02-01-2012 às 07:00 | por Mara Dionísio e Teresa Abecasis



Não é propriamente de "ano novo, vida nova" que se trata. Por muito pessimista que possa parecer, é mais assertivo dizer que, à partida, é "ano novo, vida já vista" em Portugal. Os especialistas dizem que o rendimento por habitante em 2012 vai recuar aos níveis de há dez anos.

“Estamos de facto mais pobres”, começa por dizer o economista Miguel St. Aubyn. “Podemos dizer que a previsão para 2012 dá-nos um valor do PIB per capita semelhante àquele que tivemos em 1999 ou 2000”, explica o economista do Instituto Superior de Economia e Gestão.

Quando se olha para os números do Produto Interno Bruto da base de dados AMECO, da Comissão Europeia, constata-se ainda que também houve um recuo no consumo. "Estamos agora ao nível de 2002 ou 2003", precisa Miguel St. Aubyn.

E quanto vale o hoje o PIB de Portugal? Se os “preços fossem os de 2005, o PIB seria, em 2011, de 14.561 euros por habitante”, explica o economista. Em 2012, “será de 14.125 euros, ou seja, isto significa uma quebra de 400 e tal euros por habitante”´.

Mas esta redução no rendimento disponível não deve ser encarada como uma fatalidade. “Isso não é necessariamente mau, desde que tenhamos a capacidade de satisfazer as nossas necessidades mais importantes, que é ter uma casa, saúde, um emprego”, sublinha Isabel Guerra, do ISCTE.

Esta socióloga do Instituto Universitário de Lisboa defende que “nunca mais vamos ter os mesmos níveis de consumo”. “Mas também não precisamos de 35 marcas de flocos de aveia, também não precisamos de não sei quantas marcas de salsichas”, frisa.

Há crise e crises
A crise é universal, anda de país em país, sociedade em sociedade. São várias crises dentro da mesma. Começa com a “globalização”, a seguir é a “financeirização” da economia e a terceira é a crise nacional. “Um modelo errático de desenvolvimento”, diz Isabel Guerra.

Segundo o último relatório da Organização Internacional do Trabalho, o modelo de desenvolvimento que tem sido seguido “não cria emprego” e o que trabalho que cria “é de baixos salários, é precário, com condições peníveis de trabalho”, refere a socióloga do ISCTE.

Quer isto dizer que “muitas das famílias, mesmo as que têm emprego, têm baixos rendimentos”. “Para terem uma ideia, um terço das pessoas que recebe o rendimento social de inserção está a trabalhar, só que aquilo que recebe não dá para viver”, diz Isabel Guerra.

E a situação piora quando se perde o trabalho. “O grupo social que está pior é o dos desempregados - é uma taxa muito elevada e é a situação mais gravosa”, explica Isabel Guerra, acrescentando que “aquilo que é novo é que a crise nivelou por baixo as classes médias”.

"Aproximou as classes médias daqueles que tinham rendimentos muito baixos e, nesse sentido, apanhou franjas muito alargadas da população."

A taxa de desemprego está quase nos 13%, o que quer dizer que cerca de 700 mil pessoas não têm trabalho. O desemprego é, por isso, um dos maiores problemas da economia. “Se quisermos um indicador de disfunção num sistema económico, temos de admitir como tal as pessoas que querem trabalhar e não estão a trabalhar”, diz o economista Miguel St. Aubyn.

Hoje em dia “somos todos potencialmente pobres”, lamenta Isabel Guerra. “Se amanhã perder o emprego, vai ter que se candidatar ao rendimento social de inserção e depois vai aparecer nas estatísticas como pobre”, explica.

Que soluções?
“O mais importante para mim seria um conjunto de medidas que pudessem rápida e eficazmente apoiar a parte da população que mais pode sofrer com este ajustamento: os mais pobres e os que ficam desempregados”, diz Miguel St. Aubyn.

Na mesma linha, Isabel Guerra propõe “fazer uma verdadeira reforma agrária para produzir” bens que o país necessita e “dar apoio aos desempregados”.

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