Sócrates exigia 2 milhões de euros para aprovar licenciamento, disse arguido a testemunha
Augusto Ferreira do Amaral disse hoje em tribunal que o arguido Manuel Pedro lhe confidenciou que o ex-ministro do Ambiente José Sócrates exigia dois milhões de euros para aprovar o licenciamento do empreendimento Freeport, em Alcochete.
Imagem: PEDRO ROSA MENDES
Ouvido como testemunha de acusação no tribunal do Barreiro, onde decorre o julgamento do caso Freeport, o advogado Augusto Ferreira do Amaral referiu que Manuel Pedro lhe confidenciou, em janeiro de 2001, que José Sócrates exigia 500 mil contos e que estava "chocado" e "escandalizado" com a exigência do então ministro do Ambiente, revelando-lhe que um dos administradores do Freeport ia deslocar-se a Lisboa para tratar pessoalmente do assunto.
A testemunha, que disse conhecer Manuel Pedro desde os tempos em que este era aluno da Faculdade de Direito, disse ao coletivo de juízes estar convicto de que o arguido disse a verdade, porque estava a ser "espontâneo" e a gravidade do assunto não permitia outra atitude.
O advogado, que representava os interesses da Mckinney, promitentes compradores dos terrenos onde mais tarde foi construído o Freeport, relatou que quando Manuel Pedro lhe falou das exigências das autoridades ambientais pensou tratar-se de diretores, ao que este respondeu "upa, upa", dizendo a mesma frase quando lhe perguntou se era o chefe de gabinete ou o secretário de Estado.
Garante que Manuel Pedro lhe disse o nome de "José Sócrates" como a pessoa que exigia aquele "montão de dinheiro" para viabilizar o projeto.
Augusto Ferreira do Amaral precisou ao tribunal que a alegada exigência de Sócrates, no valor de 500 mil contos, foi transmitida a Manuel Pedro por um porta-voz do então ministro do Ambiente.
Revelou ainda que Manuel Pedro, apesar de "chocado" com o caso, estava "resignado", mas feliz porque o projeto, finalmente, ia avançar e que o emissário de Sócrates, cujo nome nunca precisou, indicou um número de conta para os ingleses depositarem o dinheiro.
"Eu não quis acreditar", declarou em tribunal Augusto Ferreira do Amaral, admitindo, em resposta a questões da advogada de defesa Paula Lourenço e do presidente do coletivo de juízes, Afonso andrade, que a acusação de tentativa de extorsão aos arguidos Manuel Pedro e Charles Smith é um absurdo, porquê aparentemente se tratou de um caso de corrupção em que a culpa é dos membros do Governo.
Augusto Ferreira do Amaral garantiu que não voltou a falar com Manuel Pedro sobre os contornos do negócio porque "teve a sensação que ia destapar alguma coisa que não ia ser agradável", muito embora ainda tenha sido Manuel Pedro a alertar a testemunha para o facto de no último Conselho de Ministros do Governo PS em 2002 ter sido aprovado uma alteração dos limites da Reserva do estuário do Tejo para permitir a edificação do projeto Freeport.
Augusto Ferreira do Amaral disse não dispor de provas, nem lhe ter sido dito por Manuel Pedro, que o dinheiro chegou efetivamente a ser pago por causa da exigência atribuída a José Sócrates, mas observou que a vinda do administrador do Freeport a Lisboa e a existência de uma reunião deste com um alto responsável do Ministério do Ambiente indicia que tudo ficou resolvido naquele sentido.
O tribunal ouviu ainda Maria Fernanda Vara Castor, antiga diretora regional do Ambiente e do Ordenamento do Território, cujo depoimento ficou marcado por alegadas contradições entre o que disse em fase de investigação e hoje em tribunal.
Confrontada com as declarações feitas em sede de inquérito, a testemunha admitiu que numa reunião com José Sócrates, foram discutidas diversas formas de ultrapassar os obstáculos do parecer negativo da avaliação do impacto ambiental, de forma a alterar o projeto para que este fosse aprovado e executado.
Nessa reunião, admitiu que, além de Sócrates, esteve presente o secretário de Estado do Ambiente, o arquiteto Capinha Lopes e o arguido Manuel Pedro, consultor da Smith and Pedro.
Manuel Pedro e Charles Smith respondem em julgamento pelo crime de tentativa de extorsão.
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