Violência em Londres espelha relação tensa da comunidade negra com a polícia
09.08.2011 - 10:54 Por Joana Gorjão Henriques, Londres
Actos de vandalismo puro e duro, sintoma da crise e do desemprego jovem, reflexo de tensões sociais ou grito de protesto contra uma polícia racista? Dois dias depois do início dos motins que começaram em Tottenham, Nordeste de Londres, começa a tentar explicar-se o que aconteceu.
Ainda é cedo para tirar conclusões sobre a verdadeira dimensão daqueles que são considerados os maiores motins dos últimos anos
Analistas ouvidos pelo PÚBLICO fazem a analogia com outros motins dos anos 1980 em Londres, provocados também pela morte de um membro da comunidade negra pela polícia. Os motins em Tottenham começaram com um protesto pacífico organizado por família e amigos de Mark Duggan, um homem de 29 anos morto pela polícia na quinta-feira. As circunstâncias em que ocorreram os disparos estão a ser investigadas e a ser alvo de polémica. Nas ruas de Tottenham muitos gritavam palavrões contra a polícia.
Liz Fekete, directora executiva do Institute of Race Relations (IRR), think tank que faz pesquisa sobre questões raciais, lembra que esta não é a primeira morte de alguém da comunidade negra às mãos da polícia este ano e que "este não é um facto isolado". Em Março, o músico Smiley Culture foi morto durante uma busca policial em sua casa, em Londres; em Abril, um jovem negro, Kingsley Burell, morreu nas mãos da polícia em Birmingham e em Maio houve a morte de outro jovem londrino, Demetre Fraser, na mesma unidade policial de Birmingham. "É um problema que persiste", diz Fekete, que critica a forma como "a família de Duggan foi tratada pela polícia e pela Comissão independente de Queixas da Polícia". "Acho que não terem respostas foi o ponto principal para criar frustração com a polícia." Harmit Athwal, também do IRR, tem analisado as notícias sobre as mortes na polícia e observado a indignação contra a ausência de explicações - isso tem vindo a galvanizar a comunidade. "Sem informação, as pessoas tiram as suas conclusões e..."
Para quem tem estudado motins no Reino Unido como Paul Bagguley, da Universidade de Leeds, estes têm características semelhantes aos dos anos 1980 e de 1985 em Londres e Liverpool, iniciados por uma série de detenções da polícia. "Todos estes motins têm a mesma característica: a polícia aparece com a imagem de ser injusta." Novo será a forma como as redes sociais e os telemóveis estão a ser usados para mobilizar mais pessoas mais rapidamente, tornando o controlo da situação mais difícil. "Nos anos 1980, os que foram presos eram sobretudo locais. Será interessante ver se é esse o caso agora."
Um problema geracional
As relações tensas chegam a um ponto de ebulição tal que o resultado são ruas a arder. Apesar de achar que a comunicação melhorou em 30 anos, os negros ainda são mais parados pela polícia e associados à criminalidade, analisa o especialista. Mas as motivações serão diferentes para os jovens que rapidamente se mobilizaram: "Alguns serão motivados pela raiva, outros estão apenas nas ruas e respondem imediatamente, outros irão apenas para assaltar as lojas."
Para Liz Fekete, é cedo para tirar conclusões, mas a especialista em relações raciais vê os motins, desencadeados sobretudo por jovens, como o reflexo do problema de uma geração. "É uma questão racial também ligada às altas taxas de desemprego jovem, a um sentido de alienação e pobreza, em que os jovens sentem que não têm um lugar na sociedade. Mas é definitivamente um problema geracional."
No Reino Unido, um em cada cinco jovens entre os 16 e 24 anos está desempregado. Desdobrando os números, segundo dados do director do Runnymede Trust, Rob Berkeley, isto significa que a taxa de desemprego entre jovens é de 20% na comunidade branca e 50% na comunidade negra.
"É óbvio que há uma ligação entre o desemprego jovem e actividades criminais", diz Matt Grist, do think tank Demos. Mas Grist recusa explicar os motins com as taxas de desemprego. O analista, que participou na publicação de um estudo sobre desemprego jovem, acrescenta que o alargamento do ensino obrigatório dos 16 para os 19 anos é positivo para a sociedade, mas deixou um problema por resolver: "Há 15 anos muitos dos que tinham 16 anos trabalhavam, agora quase ninguém o faz. O sistema mantém as pessoas mais tempo na escola, e o que acontece é que aqueles que não têm sucesso desligam. E não há alternativas para esses. É preciso mais imaginação para pensar em actividades que desenvolvam as suas capacidades." Há ainda outro factor que explica o que aconteceu, tão simples como ser Verão: não há escola e muitos não têm nada que fazer a não ser arrastarem-se de esquina
Sem comentários:
Enviar um comentário