sexta-feira, 26 de abril de 2013




Posted: 25 Apr 2013 03:33 AM PDT
A falta de liberdade de expressão pode ser encontrada em vários locais. Um desses é na imprensa, onde o mainstream é gerido pela publicidade e as grandes empresas.
A história é contada no Blog da agora ex-jornalista da Exame e do Expresso, que se despediu após lhe ser retirado de um trabalho sobre fundos de investimento um parágrafo em que fazia referência a uma recente condenação do BCP.



O artigo escrito pode ser encontrado aqui (PDF), sem as linhas “apagadas” pela Exame, que em 2011 foi anunciada como a “revista mensal mais reputada”. Conta Marisa no seu blog que “a direcção da Exame ultrapassou todos os limites éticos e legais e, qual lápis azul salazarista”.

– Para ler também: Millenium BCP bloqueia conta de donativos do Tugaleaks com base na lei de “combate ao terrorismo”

Da própria jornalista, em pleno dia da Liberdade – ou, em muitos casos, da falta dela – foram respondidas algumas perguntas sobre o seu despedimento.
Marisa Moura confessa que tentou anular a demissão e voltar a demitir-se por justa-causa mas que o prazo legal para o fazer já tinha passado. Diz ainda que “reuni com uma advogada e com o advogado da Impresa e nem exigi qualquer recompensa monetária, mas simplesmente que publicassem na Exame que aquele artigo continha dois parágrafos que a direcção retirou à revelia da autora, que os publicassem, que informassem os leitores que a jornalista já não escreveria mais ali porque se despediu acusando a direcção de censura, e que lhes pedissem desculpa, aos leitores. Não publicaram nada (…)”.
Trabalhou dez anos no grupo Impresa. A antiguidade não é um posto certo, nem de respeito ou dignidade.
Este caso “ilustra bem a promiscuidade entre os media e as empresas, e neste caso em concreto ilustra um dos efeitos perversos deste modelo de negócio que, tendo as suas virtudes, propicia situações como esta em que um órgão suja a imagem de um anunciante ou credor, e outro do mesmo grupo vai limpar as nódoas. O grupo Impresa tem a SIC, o Expresso, a Visão, a Exame, e uma série de outras revistas, como a Caras e a Activa, que também entram nas negociações em pacote com os anunciantes”.
Será apenas coincidência que hoje em dia seja extremamente difícil tocar nas grandes empresas multinacionais? A resposta a esta pergunta virá da consciência do leitor, mas, além da reunião com a advogada fez também queixa ao Sindicato dos Jornalistas.
Na sua decisão, o Sindicado dos Jornalistas afirmou que “(…)também porque os dois parágrafos retirados foram substituídos por outros que constavam do texto original da autora, não é possível ao CD concluir de forma inequívoca ter-se tratado de um acto de censura”.
A interpretação da jornalista é simples: “se escrever meio texto mais positivo, e a última metade mais negativa, e me cortarem a última metade toda, repaginando o texto, já não é censura porque não ficou nenhum buraco em branco e todo o texto publicado é de autoria da mesma pessoa”

Para a jornalista, que conta com duas queixas contra organismos públicos, a censura está bem viva nos dias de hoje, “(…) não só da parte das chefias dos órgãos de comunicação social e na forma de auto-censura dos jornalistas, mas também, claro, por parte dos governos e organismos que dele dependem directa ou indirectamente. Tenho duas queixas apresentadas em Janeiro deste ano 2013. Uma contra o Ministério da Justiça e outra contra a Direcção Geral dos Serviços Prisionais (entretanto denominada Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais entre a data dos factos e a apresentação da queixa). Ambas no âmbito de uma reportagem fotográfica com produção a meu cargo, para um jornal internacional, em Novembro do ano passado. Prefiro não identificar o título em causa, pois neste caso concreto não se tratou de um trabalho que me tenha sido directamente atribuído a mim, mas em que estive ao serviço de um fotógrafo freelancer estrangeiro que, por sua vez, estava ao serviço do jornal. A queixa contra o Ministério da Justiça é por ter vedado o acesso a um tribunal. A outra por vedá-lo a uma prisão. Ambas as recusas com argumentos inaceitáveis numa democracia como Portugal, oficialmente, ainda é.”

Exame afirma que paga mal aos colaboradores

Em 2007 a jornalista foi editora de secção Empresas & Negócios da Exame. Abdicou do cargo quando lhe disseram para ser menos exigente, principalmente com o pessoal externo. A frase que Marisa retém é “Não sejas tão exigente, sobretudo com os colaboradores externos. Pagamos-lhe mal, mas precisamos deles”. Diz que “tinha aceitado o cargo por, claramente, haver muito trabalho a fazer ao nível da qualidade e sentir que o conseguia fazer. Mas a partir do momento em que a direcção exigiu que se mantivesse a bitola da mediocridade, esvaziaram-se as minhas funções, logo o cargo. Logo, abdiquei do cargo nesse mesmo instante, bem como dos 300 euros extra de ordenado que tais funções remuneravam. Mantive-me como jornalista, até que entretanto, três anos depois, me vi obrigada a sair definitivamente da revista e do grupo”.
Marisa Moura está desempregada, honrada e precária. A experiência de dez anos numa das maiores empresas detentora de publicações periódicas e não só em Portugal pode ter valido de muito. Mas a dignidade com que saiu, pode valer mais ainda.
Em Portugal os casos de censura jornalística são vários. A Reports Without Borders mantém uma lista de casos, a maioria deles onde jornalistas são suspensos por recusarem a revelar as suas fontes como o caso do jornalista José Preto.
Hoje comemora-se a liberdade, e por isso, é de todo importante salientar, que a informação ainda não é livre.

O Tugaleaks tentou entrar em contacto o grupo Impresa e o diretor atual do Expresso, por e-mail, mas não recebem qualquer resposta

Sem comentários: