Caso BPN
“Fui entregar o dinheiro aos ladrões do banco”
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São muitos os clientes que se dizem enganados pelo Banco Português de Negócios. Dois anos volvidos desde a sua nacionalização, estes clientes batem-se na justiça pela devolução do dinheiro.
23-01-2011 18:15 por Mara Dionísio
“Fui com todos os cuidados com o dinheirinho debaixo do braço para não ser assaltada e fui entregar o dinheiro aos ladrões, ao banco. Ao banco que devia ser gente idónea, gente de respeito, mas são uma cambada de ladrões. Ladrões”, acusa Maria Oliveira Muge, de 82 anos.
Tinha na altura 80 anos, quando levou as poupanças de toda uma vida de trabalho debaixo do braço para as depositar no Banco Português de Negócios (BPN).
Deixou-se convencer por aqueles que falavam bem da instituição e lá foi: “Dona Maria, tenho aqui uma coisa muito boa para si. São umas aplicações em papel”, relembra Maria Muge a conversa que teve com o gestor que a recebeu na caixa de Ovar.
“E eu disse logo: vim aqui para depositar o meu dinheiro a prazo. Isso que fique bem claro. Eu quero o meu dinheiro a prazo”, adverte Maria Muge. Conta que lhe foi dito que era “garantido”, que era a décima emissão, que nunca tinha havido problemas, nem ia haver”. Mas, ainda com dúvidas, pergunta: “desculpe, mas pode haver uma falha. E depois quem é que me paga?”.
“Então a dona Maria não confia em mim, a senhora conhece-me. A senhora não confia em mim”, ter-lhe-á perguntado o gestor “que era uma pessoa muito atenciosa”.
“A última coisa que ele me disse para me convencer foi que, se falhar, que não vai acontecer, mas se falhar, o banco paga, o banco responsabiliza-se”, relembra.
Finalmente, Maria Oliveira Muge acedeu e “depositou” o dinheiro. Dinheiro esse que terá sido aplicado em papel comercial de uma cimenteira, a CNE, agora insolvente e que era participada pela ex- Sociedade Lusa de Negócios.
A mesma garantia de que se tratava de um depósito a prazo foi dada a Amadeu Santos. Este médico do Porto, e que diz ser um depositante avesso ao risco, afirma que na agência ter-lhe-ão apresentado o papel comercial da cimenteira da mesma forma.
“É um produto do banco, um produto garantido, um depósito a prazo. Foi assim que me foi dito, que correspondia a um depósito a prazo”, conta.
Actualmente, tem no BPN o dinheiro de toda a família: “A minha filha tem lá 150 mil euros, a minha mulher 100 mil e eu tenho lá 600 mil”.
Foi através da comunicação social que ambos perceberam que o banco estaria em apuros. Amadeu Santos explica que “como tinha confiança no funcionário interroguei-o e ele disse que não tem problema nenhum que o banco vai pagar”. “E eu perguntei-lhe: e não há possibilidades de resgatar isso? E ele respondeu: já não há possibilidades porque já não há quem compre”.
“Isto foi quando eu me apercebi. Foi quando o banco foi nacionalizado e foi ai que me apercebi que havia algum problema grave com o banco”.
Maria Oliveira Muge quando ouviu os rumores também foi ao banco. Mais uma vez, sublinha, o gestor disse-lhe: “dona Maria, a comunicação social é assim”.
“Disse que o banco tinha muito património e enumerava-me o que tinha: tinha vinhas, tinha terrenos, tinha outros negócios. Tinha isto e tinha aquilo. Tinha um mundo”. “Eu regressei a casa, meia convencida e rezando para que o meu dinheiro viesse de volta para eu o levantar”, recorda.
Mas o dinheiro nunca foi levantado. Maria Oliveira Muge colocou o “banco, a CNE e o gestor” em tribunal. Também Amadeu Santos recorreu à justiça.
Dois anos volvidos, e a viver de uma reforma “que nem chega ao salário mínimo, Maria afirma que “a esperança é a última que morre”. Amadeu, por seu lado, diz que “com esta cambada de ladrões nunca há esperança nenhuma”.
Estes são apenas dois casos de clientes que se dizem lesados pelo BPN. Só a Associação Nacional de Defesa de Clientes BPN reclama na justiça 17 mil milhões de euros, em nome de 4.600 clientes.
A Renascença tentou, por várias vezes, obter mais esclarecimentos junto da actual administração do banco, liderada por Francisco Bandeira, mas sem sucesso.
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