domingo, 20 de outubro de 2013

ENTREVISTA: "GRANDE F. DE. P." (Grande filho de Portugal)

 

A entrevista de Sócrates ao Expresso, de 19-10-2013

O conteúdo da entrevista de José Sócrates a Clara Ferreira Alves, na revista do Expresso, de hoje, 19-10-2013, pp. 24-34, obriga-me ao comentário, distribuídos por vinte cansativos pontos:

  1. Uma entrevista de um José Sócrates blasé nas fotografias de modelo - tiradas por Tiago Miranda, com roupas e botas da moda, halo mítico, com céu e Tejo por fundo - e no discurso ambivalente filosófico-escatológico, désabusé do «favor do povo» ingrato, com uma atitude de superior arrogância sobre adversários e amarga displicência sobre a política do género são-verdes-não-prestam...
  2. Uma entrevista narcisística - que outra poderia ser?... - com pretexto de episódios da sua vida e da ruína popular, como a sua inscrição no PPD, a sua ascensão no PS, o Governo Guterres, a tomada do poder, a campanha de 2005, o Freeport, a nacionalização do BPN, o despesismo do seu primeiro Governo, os voos da CIA pelo território português, a freudiana justificação filosófica da sua atitude perante a verdade, o luxo e o dinheiro, as escutas à Presidência da República, o PEC IV e o pedido de resgate financeiro à União Europeia e ao FMI.
  3. Uma entrevista de favor, à mesa de restaurante italiano (de que outro lugar gostaria mais?), combinada pelo mano Ricardo (Eu-Sou-Controlado - o linque foi apagado, mas a gente não esquece...) do Costa, de compensação pela pré-candidatura preterida a Presidente da República, com a simone-de-oliveira Ferreira Alves, no forro, tão eixo do bem (apesar de se vangloriar de «advogada do diabo»), de uma casaca sebenta, ela tão aborrecida por ter de «remexer em mexericos a par das questões patrióticas» (sic), tão dada que até vê «alguma candura» (!...) no entrevistado, cujo trabalho (o mémoire de mestrado) a crítica literária avalia como «bem escrito e bem argumentado», a quem pergunta pelo «exame de Inglês Técnico ao fim de semana» (sic!?... com medo de lhe perguntar pela licenciatura domingueira), que questiona, com o eufemismo da perseguição da liberdade de informação e de opinião, o «desejo de litigância» (sic!?...) e que lhe pergunta pelo «mail do primo» Hugo, mas jamais pelo primo José Paulo Bernardo Pinto de Sousa, alegadamente aka «Bernardo» ou «O Gordo».
  4. Um Sócrates esquivo, falacioso nas respostas, e com versões seletivos de factos indiscutíveis, todavia, amargurado pelo seu recorrente problema com a verdade, «Essa questão da verdade...», que freudianamente procura justificar, enquanto vítima que se crê desse deontologismo. Intentando sublimar a verdade, põe a política numa categoria diversa - «o reino da opinião» -, dizendo que «só pretensos políticos pretendem fazer da política uma luta entre a verdade e a mentira». 
  5. O tardofilósofo, no qual se percebe algum fascínio por Carl Schmitt, argumenta com a «ética da responsabilidade» e pretende que sempre se filiou nas correntes do consequencialismo e do utilitarismo, o utilitarismo de Bentham e Stuart Mill». Contesta o deontologismo de Kant de «nunca mentir», mas gloria-se de que já leu a sua (Fundamentação da) Metafísica dos Costumes» (196 páginas) «uma dez vezes».
  6. Passando como raposa pela vinha vindimada do caso da licenciatura, sem responder à questão domingueira sequer, nem ao Inglês Técnico - «se quiser falar disso... falo» (mas não falou...).
  7. Sócrates justifica a sua inscrição no PSD por «convicção doutrinária». E afirma: «Não tinha nenhuma simpatia por Sá Carneiro, pelo contrário, e a única coisa boa foi a liderança do Guerreiro». Porém, José Sócrates apresentou o seu pedido de inscrição no PPD em 5 de novembro de 1974 e Emídio Guerreiro só foi secretário-geral do PPD em 1975, durante os meses em que Francisco Sá Carneiro se deslocou a Inglaterra para se tratar de doença inesperada. 
  8. A sua oratória alterna entre a pretensa elevação filosófica e a ostensiva rasteira escatologia. A expressão bem pensante - e até o gosto peculiar pelo adjetivo «horrível» -, contrasta com o discurso de merda-para-aqui-merda-para-acolá (com desculpa dos leitores): «a merda de um moderado»; «a merda da política». A questão da sujidade das mãos («calcular o mal menor... é isso sujar as mãos») parece também perseguir o seu espírito no exercício da política.
  9. O «animal feroz» descreve-se agora como «um tipo que sempre foi a merda de um moderado»...
  10. Dando aparentemente razão à minha hipótese de que planeia o doutoramento conjunto possivelmente com Universidade da Columbia, do seu amigo Manuel Pinho (e daí o teste do IELTS que teve de realizar, em 29-8-2013) e a Sciences Po, agora que o projeto presidencial (e o de ser comissário europeu) se esfumou na noite das eleições autárquicas de 29-9-2009, apesar do anúncio no Expresso, de 21-9-2013, de que, com a publicação do livro com o «mémoire» sobre a tortura, «fechar o ciclo iniciado com a ida para Paris em 2001 e concluído com a defesa da tese em junho», vai ter de voltar à desculpa académica para a continuação do prudente exílio. Pois, na entrevista responde: «eu fui e ainda sou estudante da Sciences Po»... Ora, se terminou o mestrado, a única razão para dizer que ainda é estudante da Sciences Po, é que vai continuar para doutoramento ao contrário do que consta da notícia de Ricardo Costa, no Expresso, de 21-9-2013.
  11. Diz que tem agora uma vida boa: «nem sabia que existiam vidas assim, vidas tão boas. Nunca tinha tido uma vida dessas». Sabia, sabia; tinha, tinha. E procura justificar essa vida com a «fortuna» da mãe, de «muitos prédios (sic), «andares». Manda, todavia, a sabedoria popular que se desconfie da fortuna, tal como da santidade: «riqueza e santidade é sempre menos de metade da metade»... 
  12. Sobre o fausto paririsiense, alega que telefonou à sua «gestora de conta» (na CGD?) e pediu «um empréstimo ao banco de 120 mil euros», para «um ano sem nenhuma responsabilidade e levando um filho comigo», confessando «gastei o dinheiro todo». Realmente, vidas assim, e ainda para mais na esquerda-tão-esquerda de que se reclama nesta entrevista, há muito pouco... A esse luxo dos 120 mil euros na Paris das luzes e sombras, chama, todavia, a «vida contemplativa que tive nestes dois anos» - o que deve, na realidade, ser a nossa a contemplar tal fausto. Embora, depois, já fale nas «misérias da minha conta bancária» (sic) - não se percebe se o gasto dos 120 mil euros, se dos outros rendimentos e despesas.
  13. Justifica que agora trabalha para uma «empresa suíça, porque fui convidado a trabalhar na América Latina».
  14. E, se não tem guarda-costas ou seguranças desde que saí de primeiro-ministro, tem «o motorista de sua mãe»!... Portanto, nada de confusões, o motorista que usa não é seu. 
  15. Alega que não soube («só soube a posteriori»...), quando estava no poder, dos voos da CIA por território nacional (e aeroportos de bases militares portuguesas como a das Lajes, nos Açores), com prisioneiros da Al-Qaeda para lugares secretos onde eram torturados. Pelo sim, pelo não, defende-se: «Se fizeram isso... é preciso haver provas»...
  16. Nem sabia do buraco do BPN (para além dos «600 milhões de euros») - «não sabia o que aquilo era» e que o nacionalizou para evitar o contágio financeiro. Portanto, não se confirma a tese de que foi para ficar dono de Cavaco Silva, através da informação que o banco possuía sobre compra e venda de ações da SLN pelo Presidente e família.
  17. Justifica a festa do despesismo das PPPs no seu primeiro governo com a «boa doutrina económica»...
  18. Desculpa-se que só pediu o resgate financeiro, que nos traz agrilhoados, porque o PSD se opôs ao PEC IV, ainda que no final da entrevista confesse: «a alternativa era o default», «assinei».
  19. Alega que «a campanha das escutas» («o primeiro-ministro está a escutar o Presidente») que as suas operações suaves puseram nos média na véspera das eleições de 2009, dezassete meses depois de os factos terem ocorrido, foi pensado por um assessor do Presidente (que não nomeia, mas se percebe querer dizer Fernando Lima»), dizendo que se tratou de «uma conspiração da direita política com ligações á Casa Civil do PR para me impedirem de ganhar em 2009». Esqueceu-se, porém, da queixa do seu sucessor socialista, António José Seguro, sobre escutas em «telefones, computadores e outros meios» na sede do Largo do Rato...
  20. Finalmente, aproveita, esta ocasião do pergaminho académico, a que por cuidado, embora incida freudianamente sobre a tortura, dá o título de «A confiança no mundo», para atacar os adversários políticos e os média, que não reconheceram, o que se percebe crer, numa interpretação alienada da sua persona criada, o seu valor superlativo enquanto «chefe». Sem pejo, diz: «eu sou o chefe democrático que a direita sempre quis ter» (sic!!). O chefe que já não é de uma esquerda que o dispensou... E ataca com insulto e rancor, os inimigos: «raios vos partam, vou vencer-vos a todos» (os rivais e aristocratas do PS); «pulhas»; «o bandalho» do Santana Lopes; Teixeira dos Santos que «se foi abaixo»; «o estupor» e «filho da mãe» do Schäuble; o «traste de um político» (Passos Coelho?) que «invoca a razão de Estado para pôr em causa a Constituição e a lei» (em contraste com essas duas «linhas vermelhas que nunca ultrapassarei, como político»; «os filhos da mãe da direita»; os «pistoleiros» do Correio da Manhã («fui alvo de uma perseguição política e pessoal de uma direita hipócrita»), além de Miguel Relvas que tuteava (e «achava-o um gajo decente»), mas «nunca mais falei com o Relvas» (nem agora no regresso aos écrans); e até ao episódio, que mais lhe custou, do rumor posto a circular sobre uma alegada relação homossexual sua com com Diogo Infante «pessoa que nunca conheci e com quem nunca falei na vida» (note-se, aliás, que o ator Diogo Infante casou-se civilmente com o seu agente Rui Calapez, segundo o CM, de 19-10-2013, com quem vivia «há vários anos»). Em suma: um ajuste socratino de contas com os inimigos e o povo mas, como sempre, seletivo na memória.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa, objeto da entrevista ao Expresso, de 19-10-2013, e de notícias que comento, não é aqui imputado de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

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